É por meio das eleições que o cidadão exerce a democracia e o seu direito à cidadania previsto constitucionalmente, participando politicamente por meio do voto, transferindo-o e investindo credibilidade em seus representantes políticos.
Na era digital, há uma nova capacidade de processamento das informações e a adaptação da sociedade a novos hábitos tecnológicos e isso incrementa mudanças significativas em como as eleições vêm sendo executadas. Não obstante, muito se sabe que diversos tipos de dados pessoais estão envolvidos e utilizados em um processo eleitoral, seja de natureza comum, seja de natureza sensível.
Com a vigência da Lei Geral de Proteção de Dados no Brasil (LGPD) desde 2021, as eleições previstas para 2022, poderão contar com uma mudança radical em seu sistema de proteção de dados pelos agentes de tratamento, uma vez que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) está analisando a aplicação da LGPD no cenário eleitoral.
Para comprovar a existência desta preocupação, o TSE em conjunto com a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) publicou o primeiro “Guia Orientativo – Aplicação da Lei da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais por agentes de tratamento no contexto eleitoral” a fim de orientar os políticos, candidatos, partidos e coligações. Este documento traz importantes recomendações de boas práticas a serem seguidas no contexto eleitoral.
Como descrito no próprio guia, ele foi criado com a mesclagem das sistemática das normas de proteção de dados pessoais e das normas eleitorais, com o propósito de apresentar os principais aspectos a serem considerados por candidatas, candidatos, coligações, federações e partidos políticos para o tratamento de dados pessoais das pessoas titulares, eleitoras ou eleitores em potencial. Além disto, estas orientações buscam garantir a proteção de dados, a privacidade das pessoas titulares e a lisura do processo eleitoral, sem obstruir a comunicação entre candidato e cidadão, necessária ao processo democrático.
Fica evidente que este é um grande avanço para o universo eleitoral, visto que há uma preocupação com a proteção dos dados pessoais dos eleitores, pois com a aplicação das práticas presentes no guia orientativo pelos interessados, se promove o respeito aos direitos dos titulares previstos pela LGPD e a transparência para a finalidade que os dados estarão sendo utilizados.
Assim, nota-se que o zelo com a privacidade dos dados dos eleitores sem desvios de finalidade, firmando assim, uma maior conexão entre candidato e eleitor durante o processo eleitoral, além de preservar os valores que sustentam a democracia no país.
Na prática, diversos princípios da LGPD serão exercidos, visto que eles estão entrelaçados nas novas práticas estabelecidas no guia orientativo. Por exemplo, os eleitores conseguirão acessar o motivo de seus dados pessoais serem utilizados ao preencher qualquer cadastro ou formulários sobre a participação em eventos ou reuniões de partidos políticos; sucederá o sigilo sobre dados de doadores eleitorais e de pessoas que prestem serviços para campanhas políticas (tema atualmente em debate); criação de aplicativos disponibilizados pelo partido político; recebimento de mensagens eletrônicas do candidato; a possibilidade de ter um canal para o exercício dos direitos da pessoa titular; entre outros exemplos ilustrativos presentes no guia.
Contudo, como é um tema recente, muito está em discussão e pode ser alterado a qualquer momento pelos responsáveis.
Ademais, verifica-se que há fortes controvérsias em relação à Lei Eleitoral e a LGPD, uma vez que possuem argumentos contrários em relação à publicidade e à privacidade e se divergem em vários aspectos.
Como exemplo, conforme a Lei Eleitoral, os partidos devem divulgar nome e CPF dos colaboradores de doação eleitoral e os valores que foram utilizados, além de determinar um limite de 10% dos rendimentos brutos do doador no ano anterior ao do pleito. Contrário a esta posição, a LGPD qualifica como dados sensíveis às informações referentes a filiação de partidos.
Dessa forma, em 2021, o TSE decidiu remover as bases de dados que continham essas informações referentes aos doadores a fim de cumprir com a proteção da privacidade dos titulares de dados. Percebe-se que há uma contrariedade nas normativas e muito há de se discutir e decidir em relação ao que será apropriado ou não na eleição que se aproxima.
Infere-se, pois, que há uma onda de desafios a serem enfrentados pelas autoridades do TSE e ANPD em suas atuações, uma vez que no contexto eleitoral, a observância das regras de privacidade em relação a proteção de dados é essencial não apenas do ponto de vista individual, mas também para a defesa da democracia. Assim, há de encontrar o ponto de equilíbrio entre a legislação eleitoral que regula diversos aspectos da atividade político-partidária com a LGPD que pleiteia a proteção de dados pessoais dos titulares.